A atual situação política do Brasil tem tomado conta de minhas
preocupações. Vivemos uma crise que impacta todas as relações sociais. Como
museóloga militante, acompanho apreensiva, aos ataques que os museus tem sido
vítimas.
Desde o início de minha carreira profissional tenho participado de
forma ativa dos movimentos sociais da área da cultura. No tempo de estudante,
nos anos 70, o país estava em plena ditadura militar iniciada com o golpe de 64.
Remeto-me inexoravelmente àqueles tempos.
Dada a pluralidade de seu objeto de estudo, as atividades dos museus são
multidisciplinares. Sejam de arte ou de ciências, todos são lugares de estudo e
de preservação da história e da memória social e coletiva.
A seleção de seus acervos reflete a história das mentalidades de
segmentos da sociedade em cada época. Não há neutralidade na seleção desses objetos/testemunhos
como também a historiografia não é neutra. A História e os museus não estão
isentos de versões, conflitos de narrativas e de disputas de poder. Por esse motivo o museu deve ser sobretudo um
lugar de crítica histórica.
Originariamente os museus eram produtos de poder da elite e dos
“vitoriosos”. Muito se caminhou no
sentido da musealização da história de grupos sociais até então invisíveis.
No Brasil caminhamos muito pouco no sentido da libertação da
mentalidade da chamada casa grande e senzala, do patrão e empregado. O
capitalismo exacerbou o valor de consumismo, da competição e da propriedade
privada. É assustador ver como se naturalizaram verdadeiras aberrações e preconceitos
sociais.
Os museus são por definição instituições publicas de função social.
No século XXI os museus são instrumentos poderosos de defesa das liberdades
individuais, respeito às diferenças e dos direitos humanos.
No século XXI a arte, a critica histórica, a filosofia e a política
terão papel predominante nos museus.
O ICOM discute novos conceitos de museu e o tema para a Conferência
Geral deste ano será - Os
museus plataformas culturais: o futuro da tradição.
As crises são um terreno fértil para a criatividade. Dialeticamente
estamos falando de revisão, reconhecimento, atualização e renovação. Novos
valores, novos embates, novos arranjos. Novas seleções de acervo e de coleções.
As novas mídias, as novas formas de registros de som, de imagens e de vídeos como
as técnicas de realidade virtual facilitarão a leitura e interpretações da
realidade.
Nos museus do século XXI a erudição, o flanar e a mera curiosidade
cederão lugar ao desconforto do desentendimento. Nestes momentos é fundamental
recorrermos á História para analisar, refletir e entender as diferenças, os
erros e os acertos, a evolução e o retrocesso.
Muitos países contam em seus museus história revolucionárias, de
conquistas e de guerras, de injustiças e de conflitos que mudaram o destino da
sociedade.
Um mundo melhor mais justo com respeito aos direitos humanos me parece
urgente nesse nosso período de crise.
Conhecer a História é condição para prever as consequências de nossos atos
hoje. Saber, ter consciência e conhecimento na direção de um mundo mais justo e
digno para todos.
Para que servem os museus? Hoje mais do que nunca eles podem ser instrumentos de conscientização. Para
isso é preciso que se tenha uma politica museológica de coleta de acervo junto
e não para a sociedade.
Nunca realizei tanto como agora que os
museus no Brasil devem ser deselitizados. É preciso reconhecer que nos últimos
tempos foram criados novos museus comunitários com grande participação popular.
No texto sobre a Missão institucional do
Museu Reina Sofia, Madrid - Espanha fala-se em construção em comum. “Por
otra parte, es primordial dejar de lado las nociones convencionales y
apriorísticas de legitimidad, nadie puede arrogarse mayor legitimidad que el
otro, así como el uso de la cultura para justificar fines ajenos a ese proceso
abierto de construcción de lo común. Quienes conforman el panorama cultural
son, por un lado, los grandes actores de la industria de la cultura y de la
comunicación y, por otro, el magma difuso de los productores que actúan desde
la subordinación de su singularidad creativa, ya sea vendiendo su capacidad de
creación, o siendo expropiados de ella. Además nos hallamos inmersos en una
profunda crisis del sistema de la que el museo no es ajeno”. https://www.museoreinasofia.es/museo/mision
Portugal inaugura o Memorial da Ditadura 45
anos depois da revolução dos cravos.
Cada edição do relatório
de previsão anual da American Alliance of Museums - AAM explora cinco
tendências emergentes, como elas estão acontecendo no mundo, o que isso
significa para a sociedade e para os museus, como os museus estão envolvidos
com essas questões e como os museus podem responder.
O TrendsWatch 2019 (Prognósticos
sobre tendência dos Museus em 2019) examina a verdade e a confiança, a cadeia
de blocos, a descolonização, a falta de moradia e a insegurança habitacional e
o autocuidado.
Hoje, como nos anos 60 em plena ditadura
militar, paradoxalmente vivemos um momento bonito de manifestações culturais.
Há uma emergente vida cultural nas periferias das grandes cidades onde proliferam
grupos de música, rap, poesia, artes plásticas e movimentos de mulheres.
As ideologias afetam a todos nós. E os
museus, não tem nada a ver com isso?
As politicas públicas no Brasil estão em
franco retrocesso.
As manifestações culturais
e a arte sobretudo são as armas das revoluções pacíficas. Os museus no século
XXI serão lugares de afirmação da vida em um mundo mais justo, mais solidário e
melhor.
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